13 julho, 2006

A revolução GNU

Como é que uma impressora defeituosa poderia levar a um dos movimentos mais revolucionários da história, desafiando grandes companhias e até mesmo o American Way of Life?
No final dos anos 70, Richard Stallman era um investigador no MIT (Massachussets Institute of Technology), usando uma impressora que não funcionava como deve ser - aliás, como a maioria delas. Mas, ao invés de fazer como o resto das pessoas fazia, que dão um jeito para a coisa funcionar, Stallman contactou o fabricante e pediu o código-fonte da impressora. O seu objectivo era descobrir o problema no programa e resolver o defeito. Simples? Não. O fabricante recusou-se a desvendar o código, mesmo com a oportunidade nas mãos de que um renomado programador do MIT que se comprometeu a devolver o código corrigido e de graça. Diz a lenda que esse foi o primeiro choque entre Stallman e o código-fonte proprietário, ou melhor, com a burrice que está por detrás dessa filosofia.

Dilema Moral

Estávamos em 1984 e Stallman, segundo as suas próprias palavras, vivia um dilema moral. Entrar para a 'indústria' de software e até ganhar muito dinheiro ou colocar os seus princípios acima de tudo e lutar para a reconstrução de uma comunidade hacker como a que existiu desde os primórdios da computação até ao final dos anos 70.

Agradeçam aos deuses da informática, pois foi isso o que ele fez: pediu a demissão do MIT e começou a escrever um sistema operativo livre que chamou de GNU, baseado na filosofia 'Software Livre'.

Um dos objectivos era reconstruir a comunidade hacker, que nesse momento tinha perdido muita da força que possuía nos anos 60 e 70.

Em Janeiro de 1984, ele começou a desenvolver o compilador GCC. Pouco depois, ele estava criando o seu mais famoso programa (e que o tirou do buraco financeiro), o editor GNU Emacs. Stallman iniciou a forma de distribuição de softwares que hoje é conhecida no movimento Open Source com o Emacs.

Esse programa podia ser encontrado nos sites FTP do MIT, mas como o acesso à Internet, era raro no começo dos anos 80, ele também vendia o programa por US$ 150.00.

Foi com o sucesso do Emacs que Stallman percebeu a necessidade de proteger a liberdade do software. Ele já conhecia a experiência com a 'pirataria' das grandes empresas de software acompanhando o projecto X Windows System desenvolvido nos laboratórios do MIT. Lançado como free software, mas com uma licença permissiva, as indústrias logo adaptaram-no para os seus sistemas Unix eo X Windows tornava-se proprietário por 'contágio'. Para o pessoal do MIT isso não era problema.

Para eles, o sucesso era a adopção generalizada do software que eles tinham desenvolvido, não importando se os utilizadores tinham perdido a liberdade de explorar, modificar ou adaptar o programa.


O conceito de copyleft

Era o oposto do que pensava Stallman. Assim nascia a GPL (Generic Public License), também conhecida como "copyleft" numa brincadeira com o inglês "copyright". Utilizando as leis e o conceito dos direitos autorais, Stallman criou uma licença para preservar o direito dos utilizadores de modificar, redistribuir, estudar e revender os softwares que utilizam a GPL desde que mantivessem os mesmos direitos nas modificações que fizessem.
Isto impede que as empresas 'raptem', os programas gratuitos desenvolvidos por indivíduos ou universidades e ganhem muito dinheiro com programas proprietários. Muita gente disse e ainda diz que isto vai inviabilizar a desenvolvimento da informática, mas não é o que tem acontecido. Dois exemplos de programas que, mesmo protegidos pela GPL foram desenvolvidos por grandes companhias são o GNU C++ e o GNU Objective C.
O primeiro foi desenvolvido pelo consórcio MCC e o segundo pela NeXT, empresa do criador do MAC, Steve Jobs. No início, as duas empresas quiseram lançar os seus produtos como proprietários, mas por causa da GPL isso não foi possível, já que os dois programas baseavam-se no GNU GCC, compilador de C criado por Stallman. Para evitar a GPL seria necessário iniciar o desenvolvimento do software desde o princípio. Seria muito mais caro e não valeria a pena.
O desenvolvimento da GPL criou uma outra licença dirigida para os manuais e a documentação dos softwares. Bem mais simples e bem menos famosa, a FDL, usa os mesmos princípios para toda a documentação relativa aos softwares livres, uma área crítica para todos aqueles que se iniciam neste universo (por causa da falta de documentos e da ainda, baixa qualidade deles).

Nenhum consenso

Todos acompanharam, nos últimos meses, os ataques dos executivos da Microsoft, contra Linus Torvalds e o Linux. Apesar do que aparenta, a maioria desses ataques não é contra a difusão do Linux nem contra Linus. A pedra no sapato da Microsoft é a licença por detrás do Linux, a GPL. Mesmo assim, a empresa de Seattle foi obrigada a fazer uma modificações importantes na licença de alguns dos seus produtor como fruto do crescimento da comunidade Free Software.

Mas quem acha que só os defensores das licenças proprietárias discordam da GPL, engana-se. Muitos programadores discordam das ideias de Stallman e da GPL. Alguns discordam dos dois.

No livro Só Por Prazer; Torvalds critica o fanatismo de Stallman e a sua defesa incansável da GPL, apesar do Linux usar a GPL desde o seu nascimento, no começo dos anos 80.

Outros sistemas operativo e softwares nem chegam a usar a GPL, mas as suas próprias licenças. Entre eles, posso citar BSD's, Netscape, X Windows (como já citei anteriormente), entre os mais famosos. Uma das diferenças básicas com a GPL é que essas outras licenças permitem que o código-fonte seja usado para a criação de software proprietário. São licenças deste tipo que permitem que a Microsoft faça uso de parte do código do FreeBSD. Claro que o facto do código do Windows ser proprietário ajuda a esconder estas coisinhas e a manter o mistério. Enquanto isso, seguem os ataques contra a GPL e o software livre.

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